
As escolas já proíbem salgadinhos, emitem boletins de obesidade e         reservam espaço nas cantinas para saladas. Recentemente, a         campanha da primeira-dama americana Michelle Obama para acabar         com a obesidade infantil prometeu reformular o almoço das         escolas e colocar os jovens para se mexer. Fabricantes de         bebidas afirmaram ter reduzido em quase 90% o alto número de         calorias fornecidas às escolas nos últimos cinco anos. No entanto, uma nova pesquisa sugere que intervenções         direcionadas a crianças em idade escolar podem ser tardias.
     
Cada vez mais evidências apontam para eventos muito cedo na vida         – quando a criança ainda é pequena, bebê e até mesmo antes do         nascimento, no útero da mãe – que podem colocar os pequenos numa         trajetória em direção à obesidade muito difícil de ser alterada         quando chegam ao jardim de infância. A evidência não é         extremamente sólida, mas sugere que esforços preventivos devem         começar mais cedo.
     
Algumas intervenções precoces já são amplamente praticadas.         Médicos recomendam que mulheres acima do peso percam peso antes         da gravidez, em vez de depois, para reduzir o risco de obesidade         e diabetes no filho; a amamentação também é recomendada para         diminuir o risco de obesidade.
Porém, restrições de peso ou dieta em crianças pequenas têm sido         evitadas. “Antes, era um tabu classificar uma criança com menos         de 5 anos como acima do peso ou obesa, mesmo que a criança o         fosse”, diz Elsie Taveras, da Faculdade de Medicina de Harvard,         principal autora de um artigo recente sobre disparidades raciais         em fatores de risco precoces. “A ideia era que isso         estigmatizava demais a criança.”
     
A nova evidência “questiona se nossas diretrizes nos últimos dez         anos foram suficientes”, diz Elsie. “Não que estivéssemos         errados – obviamente, é importante melhorar o acesso a alimentos         saudáveis em escolas e aumentar os exercícios físicos. Mas isso         pode não ser suficiente.” Grande parte da evidência vem de um         estudo incomum de longo prazo de Harvard, liderado por Matthew         Gillman, que tem acompanhado mais de 2 mil mulheres e bebês         desde o estágio inicial da gravidez.
     
Assim como as crianças e os adolescentes, os bebês e as         criancinhas pequenas estão engordando. Uma em cada dez crianças         com menos de 2 anos de idade está acima do peso. A porcentagem         de crianças entre 2 e 5 anos que são obesas aumentou de 5% em         1980 para 12,4% em 2006.
No final do ano passado, um comitê de estudo do Instituto de         Medicina foi encarregado, pela primeira vez, de desenvolver         recomendações de prevenção à obesidade especificamente para o         grupo de crianças de 0 a 5 anos. O relatório, que deverá sair em         18 meses, analisará o papel do sono e dos primeiros padrões de         alimentação, assim como a atividade física.
     
“Todo mundo tem apontado para esse primeiro período, afirmando         que aparentemente ocorre algo ali que tem efeitos duradouros na         vida da criança”, afirma Leann Birch, diretora do Centro para a         Pesquisa de Obesidade Infantil da Universidade Estadual da         Pensilvânia e líder do comitê.
     
Cientistas como Leann temem o que se chama de mudanças         epigênicas. Os genes herdados da mãe e do pai podem ser ativados         e desativados, e a força de seus efeitos pode ser mudada por         condições ambientais nas primeiras fases do desenvolvimento.         Muitos médicos estão preocupados com mulheres obesas e pouco         saudáveis antes da gravidez porque o útero da mãe é o primeiro         ambiente do bebê.
Um dos estudos mais convincentes sobre a relação entre diabetes         gestacional na mãe e diabetes no filho foi realizado quase dez         anos atrás com índios pima, da América do Norte. Irmãos nascidos         depois que a mãe desenvolveu diabetes tipo 2 tiveram um IMC         (índice de massa corpórea) mais alto durante toda a infância e         tiveram quase quatro vezes mais probabilidade de desenvolver         diabetes, em comparação a irmãos nascidos antes do diagnóstico.
     
“O ambiente intrauterino de uma mulher com diabetes nutre em         excesso o feto”, diz a principal autora do estudo, Dana Dabelea,         epidemiologista da Faculdade de Saúde Pública do Colorado. Ela         acrescenta que isso “reconfigura o ponto de saciedade do filho e         o predispõe a comer mais”.
     
Especialistas afirmam que a mudança pode exigir o abandono de         alguns valores culturais. “A ideia de que um bebê grande é         saudável, a ideia de que um bebê que chora provavelmente está         com fome e deve ser alimentado, são coisas que precisamos         repensar”, desafia Leann.
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